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Energia Nuclear e seus Riscos - Conselho Regional de Química - IV Região

Energia Nuclear e seus Riscos 

 


 


Em 11 de março de 2011 um grave acidente natural atingiu o Japão: um terremoto de nível 8,9 na escala Richter, seguido de tsunami, uma onda gigantesca com mais de 10 m de altura, que varreu parte considerável da costa nordeste do país.

Nessa região estão instaladas várias centrais nucleares, que fornecem energia elétrica aos japoneses. Duas dessas centrais, Fukushima 1 e Fukushima 2, estão localizadas próximas ao epicentro do terremoto e, em virtude de ambos os acidentes, tiveram seus reatores seriamente danificados. Os reatores 1, 2, 3 e 4 de Fukushima 1 foram destruídos parcialmente. Com a interrupção do fornecimento de energia, os sistemas de resfriamento desses reatores deixaram de funcionar. Diversas explosões devido à formação de gás hidrogênio, decorrente do descontrole das reações em curso no interior dos reatores, aconteceram ao longo dos dias, liberando uma quantidade de radiação muito acima do aceitável à preservação da vida humana ou animal. Os níveis de radioatividade nas proximidades da usina atingida subiram a valores alarmantes com variações ao longo do tempo. Grandes quantidades de água contaminada, contendo material radioativo dissolvido, vazaram para o mar e gases radioativos dissiparam-se para a atmosfera. A difusão desse material pelo vento elevou os níveis de radioatividade medidos na Europa e até no Canadá, embora em níveis ainda não prejudiciais à saúde daquelas populações. No Japão, quantidades de radiação acima do aceitável também foram detectadas em peixes, principal componente da dieta japonesa. Estas informações, difundidas por todos os meios de comunicação, alertaram a população mundial sobre os riscos nucleares em nosso planeta e alguns países europeus já estão revendo seus planos de uso de energia nuclear.

Para entender o que aconteceu e ainda está acontecendo são necessários alguns conhecimentos de Ciência, especialmente de Química.

Energia nuclear

É a energia liberada dos núcleos atômicos, quando eles estão em condições instáveis. Todos os núcleos de átomos com 84 ou mais prótons são radioativos e ganham estabilidade através de reações de desintegração, formando núcleos mais estáveis. A energia nuclear constitui atualmente uma alternativa energética para muitos países, notadamente França, Alemanha, Estados Unidos, Rússia e Japão. No Brasil temos duas usinas localizadas em Angra dos Reis, no litoral do Rio de Janeiro, e duas outras, Angra 3 e 4, estão em construção.

Embora sejam construídas com alto nível de segurança, para evitar vazamento de radiação, centrais nucleares ainda apresentam riscos, especialmente quando desastres naturais como terremoto seguido de tsunami ocorrem na região em que estão instaladas. Em geral estas usinas são construídas próximas ao oceano ou a grandes áreas desérticas, por razões de mais segurança no caso de vazamentos de radioatividade.

Radiação é a emissão e a propagação da energia através da matéria ou do espaço, por meio de perturbações eletromagnéticas que apresentam duplo comportamento, como onda e como partículas. Radioatividade é a radiação ionizante, descoberta por Henri Becquerel em 1896 e extensivamente estudada pelo casal Pierre e Marie Curie. É a energia emitida por núcleos atômicos em reações nucleares. Podem ocorrer radiações de três tipos: alfa, beta e gama, além da emissão de nêutrons. Esses vários tipos de radiação têm propriedades diferentes em relação à sua capacidade de penetrar em tecidos biológicos, conforme mostrado na Tabela 1.

 

    Tabela 1 – Tipos de radiação liberada em reações nucleares 

     * massa relativa à massa do elétron (=1)

 
Vários elementos químicos, como rádio, urânio, tório, potássio, carbono e iodo, apresentam isótopos (átomos do mesmo elemento contendo diferentes números de nêutrons e, portanto, diferentes números de massa) que emitem radiação. São os chamados elementos radioativos. Diferentes materiais radioativos, baseados em elementos como estes e suas respectivas reações nucleares, são utilizados na agricultura, na indústria, em medicina (diagnósticos, radioterapia e instrumentos para radiografia), em pesquisas científicas e, principalmente, em engenharia, na produção de energia. Mas estes materiais também podem ser usados para fins bélicos, como é o caso da fabricação de bombas nucleares.

 

Unidades de radiação

Para medir o nível de radioatividade são utilizadas diversas unidades, que foram sendo introduzidas à medida que o conhecimento deste tipo de radiação e de suas conseqüências para os seres vivos foi aumentando. No início definia-se o nível de radioatividade pela energia liberada por grama de material radioativo. O Roentgen (rad) foi definido para emissão de raios X ou raios g, sendo igual a 1,00x10-5 J/g (joule/grama) do material. Outra unidade, o Gray (Gy), do Sistema Internacional (SI), corresponde à absorção de 1 joule de energia por kg de tecido. Portanto, 1 Gy = 100 rads.

Diferentes radiações provocam danos distintos a tecidos biológicos. Um rad de radiação alfa pode causar mais danos que a mesma quantidade de radiação beta. Para comparar os danos relativos provocados por diferentes radiações são usados fatores multiplicativos. O fator é denominado efetividade biológica relativa (EBR), sendo 1 para a radiação gama, 5 para a radiação beta e 10 para a radiação alfa. O resultado do produto da dose de radiação em rads pela EBR corresponde à dose efetiva de radiação em unidades rems.

 

Número de rems = (número de rads)(EBR)

A unidade SI para dosagem efetiva é o sievert (Sv), obtido pelo produto da EBR pela dose de radiação, em grays. Tem-se 1 sievert = 100 rem.

Já a unidade Curie (Ci) é definida em decaimentos por segundo. É utilizada, por exemplo, para avaliar o decaimento de níquel a cobre em detectores por captura de elétrons, de cromatógrafos a gás.

1 Curie (Ci) = 3,7x1010 decaimentos por segundo (dps)

 

Decaimento radioativo e reações nucleares dentro de um reator

Vários elementos radioativos sofrem decaimento natural, como o urânio, que dá origem a diversos isótopos de outros elementos diferentes. A velocidade de decaimento radioativo é normalmente avaliada em termos de meia-vida, t 1/2 ou t correspondente ao tempo necessário para a concentração (ou quantidade) da amostra cair à metade.

 

 

 

O isótopo 238 do urânio decai naturalmente para o isótopo 234 de tório, liberando radiação alfa. O tório formado, por sua vez, decai ao protactínio-234, liberando simultaneamente radiação beta e assim por diante, num processo em cadeia, isto é, reações encadeadas, até formar um isótopo estável. Mas este processo global de decaimento natural do urânio-238 ao tório é extremamente lento, pois sua meia-vida é de 4,5 bilhões de ano.

 

Na Tabela 2 tem-se todos os isótopos formados no decaimento do urânio-238 até chumbo-206, com os respectivos tempos de meia-vida.

 
  Tabela 2
– Tipos de radiação emitida e tempos de meia-vida de diferentes átomos radioativos. 

 

Também são conhecidos isótopos radioativos naturais de elementos mais leves, com número atômico menor que 81, como hidrogênio, carbono, potássio e rênio. Seus tempos de meia-vida podem variar bastante também, de uma dezena a trilhões de anos.

Alguns dos radioisótopos naturais são muito úteis, como o trítio (H com 1 próton + 2 nêutrons no núcleo), utilizado para marcação isotópica em estudos de mecanismos de reações químicas ou o carbono-14, usado para marcação geológica ou determinação da idade de materiais arqueológicos e rochas fósseis. A reação de decaimento natural do carbono-14 é expressa pela equação química:

 

 

 

Por outro lado, reações nucleares também podem ser iniciadas pelo bombardeamento de núcleos pesados com feixes de nêutrons, ocasionando a fissão nuclear. Isto é o que ocorre num reator nuclear. Na fissão nuclear, a energia é liberada pela divisão do núcleo, formando outros elementos. O isótopo urânio-235 apresenta t1/2 de 710 milhões de anos. Entretanto, este isótopo pode sofrer fissão nuclear, quando bombardeado por um feixe de nêutrons resultando em urânio 236 que se desintegra em 141Ba (bário) e 92Kr (criptônio), liberando energia, conforme a Figura 2:

 

 

 

  Figura 2 – Reação de fissão do urânio-235 pelo bombardeamento com nêutrons.


A fissão de 1 mol de urânio-235 libera 2 x 1010 kJ (ou 4,6 x 109 kcal) em forma de calor. Esse processo de fissão, iniciado pela absorção de um nêutron por um núcleo de urânio-235, também libera 3 nêutrons formando dois novos núcleos e provocando novas fissões nos núcleos de urânio-235, o que se constitui numa reação em cadeia, que leva à liberação continuada de energia nuclear.

Num reator nuclear as reações que ocorrem no núcleo de determinados átomos liberam quantidades enormes de energia, que são aproveitadas para gerar vapor de água, movimentar turbinas e assim fornecer energia elétrica. As reações que ocorrem num reator deste tipo são de fissão nuclear, isto é, núcleos de átomos grandes e pesados, como urânio (número atômico 92) e tório (número atômico 90) são submetidos a feixes de nêutrons e, como conseqüência, são fragmentados, gerando outros átomos menores, como bário-142 e criptônio-91. Trata-se, portanto, de uma reação em cadeia, com geração de diversos isótopos radioativos de diferentes átomos, até se chegar a um isótopo estável, com meia-vida elevada como, por exemplo, o chumbo-206. No processo global são gerados vários isótopos prejudiciais à saúde humana e ao meio ambiente, como césio e iodo. O iodo-131 (t1/2 de 8 dias) forma-se logo nos primeiros dias da reação, enquanto o césio-137 (t1/2 de 30 anos) vai se acumulando após vários dias, meses e anos.

A energia nuclear também pode originar-se da fusão nuclear de núcleos mais leves, como os de hidrogênio para formar hélio (número atômico 2). A energia irradiada pelo sol deve-se a reações de fusão que ocorrem em seu interior. A cada minuto 36 bilhões de toneladas de hidrogênio são convertidas em hélio no sol. Porém, a tecnologia para aproveitar a energia gerada em reações de fusão ainda está longe do ideal, para ser usada ou considerada como alternativa energética.


Riscos à saúde e ao meio ambiente

A exposição mesmo por tempo curto em níveis elevados de radiação ionizante acarreta queimaduras sérias e náuseas em humanos, enquanto a exposição prolongada, mesmo em níveis baixos de radiação, também traz riscos à saúde, devido à possibilidade de mutação genética. Quando uma radiação incide num tecido biológico, as características químicas das moléculas destes tecidos podem ser alteradas, formando-se radicais intracelulares (os denominados radicais livres, que são moléculas ou íons contendo elétrons desemparelhados e, por isso, muito reativos) que, ou matam a célula, ou originam divisões celulares não controláveis. No primeiro caso, o organismo consegue eliminar e substituir as células mortas, mas no segundo caso geralmente ocorrem processos de formação de tumores malignos.

A partir de uma dose de 100 milisieverts cresce o risco de câncer para o ser humano. Uma pessoa exposta a uma dose de um sievert (1.000 milisieverts) ou mais é considerada vítima do "mal da radiação" e deve ser hospitalizada. No Universo estamos sujeitos a uma “radiação de fundo”, correspondente à radiação cósmica, de 200 mrem/ano ou 1 a 10 milisieverts/ano.

Ao ocorrer acidentes nucleares, procura-se minimizar os efeitos e os riscos inerentes a eles. A água de rios, lagos e do próprio oceano podem se contaminar com compostos radioativos dissolvidos. Material radioativo, volatilizado pelas altas temperaturas alcançadas, também podem contaminar o ar. Assim, no Japão, logo após o acidente com vazamento de radioatividade para o ambiente, foram administradas pastilhas de iodeto de sódio ou potássio aos japoneses das zonas de risco, para retirada do iodo radioativo (iodo-131). Esse isótopo se concentra na tireóide, onde é solúvel, e se deposita no sistema gastrointestinal, onde é insolúvel, causando hemorragias. Através da formação de íons I3-, muito mais solúveis em água que o iodo e, portanto, mais facilmente excretável, evita-se sua permanência e concentração no corpo humano:

 

 



Leitura adicional sugerida

 1. T.L. Brown, H.E. LeMay Jr., B.E. Bursten, J.R. Burdge, Química, a Ciência Central, Pearson-Prentice Hall, São Paulo, 2005, 9a. ed., cap.21 – Química Nuclear, p.771-804.

 2. J. C. Kotz e P. Treichel, Chemistry and Chemical Reactivity, cap. 24 - Nuclear Chemistry, p. 1088-1129.

 

Autora: Ana Maria da Costa Ferreira

Professora titular IQ-USP
amdcferr@iq.usp.br

Revisão: Prof. Antonio Carlos Massabni
Unesp-Araraquara

 

 

 

Publicado em 29/06/2011

 

 

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