Com críticas às políticas do governo federal sobre meio-ambiente e à recente aprovação do novo Código Florestal pelo Congresso, ambientalistas e autoridades participaram no Memorial da América Latina da Conferência de Produção Mais Limpa e Mudanças Climáticas da Cidade de São Paulo, realizada no dia 8 de maio. Evento preparatório para a Rio+20, esta foi a décima-primeira edição da conferência, idealizada e coordenada pelo vereador Gilberto Natalini, e reuniu um público estimado em 3.500 pessoas, que lotou o saguão e o Auditório Simon Bolívar. Uma extensa lista de autoridades participou da mesa na solenidade de abertura, como o prefeito Gilberto Kassab, o próprio vereador Gilberto Natalini, o presidente da Câmara Municipal de São Paulo José Police Neto, o secretário do Meio Ambiente do Estado Bruno Covas, que representava o governador Geraldo Alckmin, o Secretário Municipal do Verde e Meio Ambiente Eduardo Jorge, além de outros secretários municipais, representantes da Ordem dos Advogados do Brasil, Universidade de São Paulo, Federações das Indústrias do Rio de Janeiro e de São Paulo e de diversas entidades. Na primeira parte da conferência as autoridades dividiram o palco com a Orquestra do Instituto Pão de Açúcar, regida pelo maestro Daniel Misiuk, formada por jovens carentes que frequentam a escola de música mantida pela empresa.
Compromisso - O encontro começou com o discurso de Antonio Carlos Pannunzio, presidente do Memorial da América Latina, que saudou o prefeito Gilberto Kassab pelo esforço que vem fazendo para transformar São Paulo em uma cidade mais sustentável. Depois dele, o vereador Gilberto Natalini ressaltou a importância da parceria entre poder público, iniciativa privada e sociedade civil porque a sustentabilidade, em sua opinião, é uma bandeira de toda a humanidade. O prefeito Kassab ressaltou a importância do engajamento em projetos que tornem o Brasil mais sustentável, e lembrou que depois de séculos de descaso, a cidade de São Paulo está se tornando cada vez melhor de se viver. “Em relação às políticas públicas, São Paulo mostra que é possível fazer alguma coisa em favor da sustentabilidade”, disse o prefeito. A palestra magna foi proferida pelo vice prefeito do Rio de Janeiro, Carlos Alberto Muniz, que comparou a cidade hoje com aquela de 1992, quando o exército teve que sair às ruas para garantir a segurança dos participantes. Muniz relatou os preparativos para a Rio+20, falou dos eventos paralelos à programação e defendeu a adoção de um novo padrão de desenvolvimento econômico para os países, com redução da pobreza.
Pesquisa - O secretário Municipal do Verde e Meio Ambiente Eduardo Jorge Martins Alves Sobrinho leu trechos de uma reportagem do jornal O Estado de São Paulo com uma pesquisa encomendada pela Confederação Nacional da Indústria. Ela mostra que 94% dos brasileiros se dizem preocupados com o meio ambiente e 52% estariam dispostos a pagar mais por produtos ambientalmente corretos. Segundo o secretário, o interesse pela questão ambiental cresceu graças à informação: “Quando a informação circula, a sociedade avança”, disse. O secretário relacionou os avanços em relação ao meio ambiente na cidade, citando a inauguração de dezenas de parques, o incentivo ao uso da bicicleta, o programa de inspeção veicular, a frota de ônibus movida a etanol e as Operações Urbanas.
O Secretário Estadual de Meio Ambiente Bruno Covas, citando a pesquisa comentada por Eduardo Jorge, afirmou que, enquanto a população se preocupa com o meio ambiente, o Congresso aprova o novo Código Florestal que anistia as multas dos desmatadores o que, em sua opinião, “mostra que a classe política não está acompanhando o que pensa a população”.
Painel - O primeiro painel programado para a Conferência teve como tema Governança Ambiental Internacional. O ex-deputado e consultor ambiental Fábio Feldman falou sobre as dificuldades que a área ambiental vem enfrentando no Brasil, e exemplificou com a recente aprovação do Código Florestal. Feldman ressaltou que a Rio+20 enfrenta grandes dificuldades porque determinou seu foco no combate à pobreza, enquanto as questões ambientais são abordadas com pouca clareza, o que ele considera um erro: ”Em 20 anos, desde a Eco 92, a ciência mostrou que a humanidade tem que enfrentar os limites do planeta. A erradicação da pobreza é importante, mas temos que ter cuidado com o planeta, ou viveremos uma situação dramática”, alertou. Ele criticou a postura do Itamaraty, que em sua opinião está fazendo o que chamou de ‘alianças estranhas’ em vez de estar liderando uma agenda do século 21 na área ambiental. “Se chefes de estado não vierem à Rio+20 ela será uma reunião de ministros, com menos representatividade”, alertou. Feldman defendeu que a conferência de junho discuta temas cruciais, como a governança em torno da sustentabilidade, a defesa dos oceanos e a criação dentro do PNUMA, o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, de um grupo com a missão de cuidar do planeta.
O segundo a participar do painel foi o professor Walter Lazzarini Filho, presidente do Conselho Superior de Meio Ambiente da Fiesp. Ele ressaltou que a situação do meio ambiente é critica no Brasil porque poucos municípios e estados possuem secretarias de meio ambiente, e quanto têm, os orçamentos são reduzidos. Alertou que é preciso preservar os biomas e os recursos naturais do País, como a floresta amazônica, o cerrado e a caatinga, que segundo ele sequer tiveram sua biodiversidade estudada, e a mata atlântica, que tem a maior biodiversidade do planeta, e proteger a qualidade de vida nas regiões metropolitanas. “Temos que evitar a poluição do solo, preservar os rios, riachos, córregos e usar a água de maneira adequada”, alertou. Lazzarini foi muito aplaudido quando criticou a corrupção no Brasil, citando notícias recentes publicadas pela imprensa sobre desvios milionários, enquanto os recursos para a área ambiental são escassos.
O terceiro participante do painel foi Mário Mantovani, diretor de Políticas Públicas da organização SOS Mata Atlântica. Ele criticou a omissão do governo brasileiro em relação à Rio+20 e alertou que o novo Código Florestal é um retrocesso, já que “rasgou todas as conquistas sócio-ambientais do País”. Mantovani lembrou que desde 1972 o meio-ambiente é considerado em quaisquer iniciativas econômicas. “Agora, com a omissão do governo brasileiro, como o Brasil vai chegar à Rio+20? O conceito de que o meio ambiente é um bem comum acaba de ser rasgado. Com que cara vamos nos apresentar ao mundo?” perguntou. Ele afirmou que o Brasil deveria estar na liderança mundial na questão ambiental por causa de seu imenso potencial, mas se omite nesta questão. Exemplificou dizendo que os produtos brasileiros poderiam ser exportados com selo ambiental, como a soja, com índices de carbono fixados, mas nada disso acontece. Mantovani exibiu cartazes com o slogan da campanha “Veta,Dilma” para que a presidente vete o novo Código Florestal, sendo bastante aplaudido. E encerrou sua fala defendendo atitudes de cidadania ativa, dizendo que cada um pode fazer sua parte, como plantar árvores, cuidar de sua rua, sua praça, fazer algo pelo bem comum.
A conferência foi encerrada à tarde, depois de outros dois painéis, que abordaram a Transição para Economia de Baixo Carbono e Construindo a Justiça Social.
Estandes - Um telão no saguão do Auditório Simon Bolívar transmitia os debates para centenas de pessoas, e o site da Câmara Municipal divulgou o evento em tempo real. No saguão estandes de várias entidades mostravam trabalhos com materiais recicláveis, como roupas confeccionadas com garrafas pet e capas de cadernos e luminárias de papel reciclado. Os participantes receberam canecas feitas de plástico reciclado e sacolas de algodão para substituir as sacolinhas plásticas banidas dos supermercados da cidade. Do lado de fora do auditório, empresas e instituições divulgavam suas atividades, como a Sabesp, que levou um caminhão-pipa para divulgar seu programa de água de reúso, e a prefeitura, que levou um ônibus da Ecofrota.