Tecnologias Analíticas em Processo - PAT
Autor(a): Fabiana Alves de Lima Ribeiro
INTRODUÇÃO
A iniciativa PAT (da sigla em inglês para Process Analytical Technology) é definida como um sistema para planejamento, análise e controle dos processos químicos e farmacêuticos por meio de medições em tempo real de atributos críticos da qualidade e desempenho dos materiais de partida e em processamento. Ela se destina a entender e controlar os processos de manufatura de fármacos e medicamentos visando o melhoramento da qualidade e segurança dos produtos. Esta iniciativa foi proposta em 2004 pela agência regulatória americana, a FDA (Food and Drug Administration), por meio da publicação Guidance for industry: PAT - A Framework for Innovative Pharmaceutical Development, Manufacturing and Quality Assurance, que contém as bases para implantação do sistema e aplica-se a todos os fabricantes de fármacos, medicamentos e produtos intermediários para a indústria farmacêutica e veterinária (1).
O sistema PAT visa à implantação de tecnologias para monitoramento e análise em tempo real de processos com o intuito de: (i) identificar e reduzir as fontes de variabilidade em todas as etapas da produção de fármacos e medicamentos, desde a entrada da matéria-prima até a liberação do produto final; (ii) promover a melhoria contínua da produção de fármacos e medicamentos por meio do entendimento científico dos parâmetros do processo; (iii) assegurar a qualidade do produto final em tempo real durante todas as etapas da produção (aprovação da matéria-prima, manipulação, compressão e/ou revestimento), visando diminuir o número de reprovações e/ou reprocessos de lotes; (iv) reduzir os erros humanos e aumentar a segurança nas operações por meio de procedimentos automatizados (1).
FUNDAMENTOS DE PAT
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Um dos focos da iniciativa é a inovação tecnológica dos procedimentos que asseguram a qualidade dos produtos farmacêuticos e o melhoramento contínuo dos processos por meio do desenvolvimento de metodologias de monitoramento direto e em tempo real na planta industrial (1-4).
Tradicionalmente, a qualidade do produto é testada no produto acabado, por meio de análises laboratoriais realizadas em processos por bateladas. Essa estratégia tem sido bem sucedida na sua intenção de garantir a qualidade dos produtos farmacêuticos, mas geralmente resulta em aumento nos custos do processo e geração de resíduos nos casos de reprovação de lotes, uma vez que as não conformidades são detectadas somente no final do ciclo de produção. No sistema PAT, a qualidade é construída e assegurada continuamente ao longo de todas as etapas que envolvem o desenvolvimento e a produção. Os desvios do processo são detectados antecipadamente, permitindo a rápida tomada de decisão (1-4).
Essa abordagem se baseia no conceito de Quality by Design (veja artigo sobre este tema na edição nº 129 do Informativo CRQ-IV), no qual é possível estabelecer as condições de contorno para as diversas variáveis envolvidas no desenvolvimento e fabricação do produto. Neste sistema, estudos sistemáticos utilizando técnicas de Planejamento e Otimização de Experimentos (DOE, de Design of Experiments) são conduzidos durante a etapa de desenvolvimento do produto, sendo as especificações de qualidade estabelecidas com base na incorporação de conhecimento científico. Adicionalmente, técnicas de gerenciamento de riscos e de conhecimento são utilizadas para monitorar e controlar a qualidade do produto durante todo o seu ciclo de vida, permitindo a melhoria contínua do processo e a obtenção da qualidade final desejada. Estas técnicas também auxiliam os órgãos reguladores a entender a estratégia de desenvolvimento e qualidade da empresa (2-5).
Os resultados dessa tática se refletem no aumento da qualidade, segurança e eficiência da produção, decorrentes de fatores tais como: redução no tempo dos ciclos de produção resultante do uso de controles e medidas on-, in- e at- lines; possibilidade de prevenir ou atenuar a rejeição ou reprocessamento de lotes; possibilidade de liberação de lotes em tempo real; utilização de procedimentos automatizados com consequente aumento na segurança do operador e redução do erro humano; otimização do uso dos recursos materiais e energéticos; aumento da capacidade produtiva da planta (3).
Essa estratégia requer o amplo entendimento científico do processo, de tal forma que os atributos de qualidade do produto possam ser explicados com precisão como uma função dos parâmetros do processo e das propriedades dos materiais de partida utilizados, permitindo que as fontes críticas de variabilidade sejam identificadas, explicadas, monitoradas e controladas. Esta abordagem é compatível com o princípio fundamental do PAT de que a qualidade do produto não pode ser testada, mas sim planejada e construída durante todo o seu ciclo de vida (1-4).
FERRAMENTAS DE PAT
As tecnologias analíticas do sistema PAT podem ser implementadas em uma única operação unitária ou em todo o processo de manufatura. Elas integram: (i) o uso de ferramentas para aquisição e análise de dados multivariados (conhecidas como técnicas de Quimiometria); (ii) analisadores de processo (na forma de instrumentação analítica); (iii) ferramentas para monitoramento e controle automático de processos; (iv) plataformas computacionais para o gerenciamento de dados e informações (1-4).
A integração destas ferramentas permite basear as especificações dos produtos e processos no entendimento científico dos fatores que afetam a qualidade e desempenho do produto, além de identificar e controlar as fontes de variabilidade destes processos. Desta forma, é possível prevenir ou atenuar o risco de gerar produtos fora das especificações de segurança e garantir a qualidade e o desempenho dos produtos em tempo real de liberação e de modo contínuo, reduzindo assim a quantidade de rejeitos e reprocessos e o custo geral da produção (1-5).
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ESTRATÉGIAS PARA IMPLANTAÇÃO
A decisão de implantar o PAT é voluntária, podendo o sistema ser adotado para um ou mais produtos da empresa. Nos Estados Unidos e Europa, as agências reguladoras oferecem suporte técnico e orientação sobre os aspectos legais durante todo o processo. Esta cooperação tem sido fundamental para viabilizar a implantação dessas tecnologias, contribuindo para o seu desenvolvimento técnico e regulatório. Há três principais estratégias para implantação do sistema: para produtos em linha, produtos em linha com alta incidência de reprocesso ou reprovação de lotes e para produtos novos. Este último caso é a estratégia ideal, pois utiliza ferramentas PAT desde a etapa de desenvolvimento do produto e processo (1-4).
ETAPAS PARA IMPLANTAÇÃO
A implantação do sistema PAT requer o cumprimento de seis etapas distintas: (i) formação da equipe; (ii) diagnóstico; (iii) monitoramento; (iv) análise; (v) controle e (vi) relatório/documentação.
A equipe deverá ser constituída por um representante de cada setor envolvido no desenvolvimento e controle de qualidade do produto, alinhados a uma equipe de pesquisadores dedicados exclusivamente à execução das atividades de PAT. Os primeiros deverão oferecer suporte à equipe de PAT, na forma de informações sobre ciclo de vida do produto e nos aspectos técnicos e regulatórios da implantação das novas tecnologias.
A fase de diagnóstico contempla uma avaliação detalhada do processo para identificação das etapas críticas a serem otimizadas e posteriormente monitoradas e controladas na fase de monitoramento, utilizando equipamentos qualificados, calibrados e validados. Modelos matemáticos para acompanhamento do processo são desenvolvidos e validados na etapa de análise e implementados em rotina na fase de controle. Todo o processo deverá ser documentado na fase (vi), juntamente com os critérios que atestam a conformidade dos critérios de desempenho e qualidade do produto.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1. Guidance for industry: PAT - A Framework for Innovative Pharmaceutical Development, Manufacturing and Quality Assurance. (http://1.usa.gov/1xx05Ok), acessada em 07/11/2014.
2. Quality by Design, European Medicine Agency (http://bit.ly/14yDapV), acessada em 07/11/2014.
3. Katherine A. Bakeev (editor), Process Analytical Technology: Spectroscopic Tools and Implementation Strategies for the Chemical and Pharmaceutical Industries, Wiley-Blackwell, 2008.
4. Lauro D. Moretto & Jair Calixto, Estrutura do Novo Sistema da Qualidade para a Indústria Farmacêutica, Sindusfarma, Volume 5.1, 2011.
5. Guidance for Industry - Q8(R2) Pharmaceutical Development, (http://1.usa.gov/1t2MXsA), acessado em 07/11/2014.
Bacharel em Química e doutora em Ciências com foco em Quimiometria, a autora é consultora em Quimiometria (DOE & Análise Multivariada) e pesquisadora colaboradora do Laboratório de Cromatografia Gasosa do IQ/UNICAMP.
Contatos pelo e-mail fabiana@portaldaquimiometria.com.