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Jan/Fev 2016 

 


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Laboratório nacional fará controle de dopagem nos jogos do Rio
Autor(a): Jonas Gonçalves


iStockphoto, com logo oficial das Olimpíadas 2016

Com a expectativa de reunir os melhores atletas do mundo, os Jogos Olímpicos e Paralímpicos, que serão promovidos em agosto e setembro deste ano, no Rio de Janeiro, deverão atrair a atenção de bilhões de pessoas. Mas ao mesmo tempo que a quebra de recordes e a conquista de medalhas são as maiores expectativas de competições como essas, os jogos também têm sido palco de trambicagens envolvendo o uso de substâncias proibidas, destinadas a melhorar artificialmente o desempenho de alguns competidores.

BBC

    Pierre de Frédy, o Barão de Coubertin

Evitar que esse tipo de desonestidade macule o lema de que “o importante não é vencer, mas competir”, difundido por Pierre de Frédy – mais conhecido como Barão de Coubertin e fundador dos Jogos Olímpicos da Era Moderna –, é um dos desafios dos responsáveis pela organização e supervisão desses eventos.

Para saber como o Brasil se preparou para esse trabalho, o Informativo CRQ-IV conversou com o Químico Francisco Radler de Aquino Neto, professor do Instituto de Química da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e coordenador do Laboratório Brasileiro de Controle de Dopagem (LBCD). Nesta entrevista, ele esclarece os conceitos básicos sobre dopagem, fala sobre os métodos que serão aplicados para impedir que atletas obtenham vantagens indevidas nas competições e explica os cuidados que os competidores devem ter antes de se medicarem e até mesmo de usarem certos cosméticos.

O que é dopagem?

Divulgação

O Químico Aquino Neto, coordenador do LBCD

A definição é mais ampla do que em geral se imagina. Além de proibir o uso de substâncias ou métodos que possam melhorar o desempenho esportivo, também são proibidas práticas que atentem contra a saúde do atleta. Portanto, o uso indevido de substâncias que prejudiquem a saúde também se enquadra no conceito de dopagem. Por exemplo, drogas de abuso [como maconha, cocaína e outras com efeitos psicoativos], apesar de não melhorarem o desempenho esportivo, também são proibidas.

A lista de substâncias proibidas é a mesma para todas as modalidades esportivas?

Há uma lista básica para todas as modalidades. Além disso, alguns esportes proíbem o uso do álcool acima de certos limites e os esportes que envolvem precisão (por exemplo, o tiro) proíbem uma classe adicional de substâncias, os betabloqueadores. Há, ainda, análises especiais para certas substâncias que devem ser solicitadas pelas Confederações e Federações, como um percentual de suas análises de urina.

Quais as principais substâncias não permitidas no esporte?

Hoje são centenas, representando mais de 15 classes farmacológicas. As mais usuais são os estimulantes, os anabolizantes, os diuréticos e os hormônios peptídicos.

Os anabolizantes são as substâncias mais usadas pelos atletas? Quais ganhos de performance eles proporcionam e quais os malefícios provocam ao organismo?

Os anabolizantes estão entre as mais comuns, mas atualmente isso está bem distribuído por várias classes farmacológicas. Os mais usados são aqueles que forem mais fáceis de serem obtidos no universo onde os atletas competem. O ganho proporcionado é de massa muscular, mas vários órgãos são afetados e a lista de problemas é extensa. Os mais graves são Acidentes Vasculares Cerebrais (AVCs), problemas graves nos rins e no fígado (inclusive câncer), alteração de humor (em geral, maior agressividade) e até mesmo adicção [dependência química]. Há um número considerável de jovens sendo atendidos em clínicas de combate à dependência química por causa de anabolizantes. Em alguns casos, em número maior do que os dependentes de drogas de abuso.

Todos os anabolizantes são prejudiciais à saúde? Se não, quando seu uso é clinicamente recomendado?

A indicação de anabolizantes é feita apenas quando há uma doença em que o seu uso seja a única forma de tentar reduzir os efeitos da mesma. Não há possibilidade de recomendação que não seja um caso médico especificamente diagnosticado. Aí, com certeza, os efeitos colaterais serão menores que os efeitos da própria moléstia que está sendo tratada.

Como será feito o controle de doping nas Olimpíadas do Rio? Haverá um único ou vários laboratórios encarregados de fazer as coletas e as análises?

O único laboratório acreditado pela WADA [sigla em inglês para Agência Mundial Antidopagem] no Brasil é o LBCD no Rio de Janeiro, mas só para fazer as análises. A coleta das amostras será feita por equipes designadas pela organização dos jogos. Após a coleta, as amostras serão codificadas e só então entregues ao LBCD. Esse cuidado é necessário para que os técnicos responsáveis pelas análises não saibam a quem as amostras pertencem.

Quais certificações precisa ter um laboratório credenciado a fazer o controle antidopagem?

Acreditação ISO 17025 (que, no Brasil, é concedida pelo Inmetro) e acreditação pela WADA.

O que são contraprovas? Como e em quais situações elas são usadas?

O controle de dopagem é o único sistema de análises forenses que tem a figura da contraprova. No passado, ela tinha a pretensão de dar ao atleta a chance de ver um frasco lacrado contendo o seu material ser aberto e analisado na sua presença. Seria uma garantia de que não teria havido alguma manipulação indevida. Hoje, isso perdeu o sentido com a garantia da cadeia de custódia da amostra e procedimentos otimizados. Porém, essa possibilidade permaneceu no regulamento. É extremamente difícil o resultado da contraprova não repetir o da prova. Tanto é assim que raramente os atletas têm feito uso dessa prerrogativa.

As provas e contraprovas serão descartadas imediatamente após as competições?

As amostras negativas serão guardadas por três meses, podendo ser reanalisadas a qualquer momento por novas tecnologias ou outras razões. Os Resultados Analíticos Adversos (RAA) [aqueles que detectaram a presença de substâncias proibidas] são guardados até a finalização do processo pelas autoridades de controle de dopagem.

As coletas serão apenas de urina? Quais serão as principais técnicas analíticas aplicadas?

Haverá coletas de urina e também de sangue. As técnicas são várias, todas baseadas em cromatografia acoplada e espectrometria de massas.

iStock

O desejo de ganhar títulos, ascensão social e independência financeira levam muitos atletas a recorreram ao doping. Outros são punidos por usarem produtos médicos ou de venda livre, mas que possuem em suas formulações substâncias proibidas. Talvez o caso mais famoso de doping seja o do ciclista norte-americano Lance Armstrong, vencedor sete vezes consecutivas da Volta da França. A lista também inclui, entre outros, os velocistas Ben Johnson e Marion Jones, a nadadora Rebeca Gusmão, a ginasta Daiane dos Santos, e a saltadora Maurren Maggi. Diane foi suspensa por ter tomado diuréticos; Maurren, pelo uso de um cicatrizante.

O controle antidopagem é feito somente durante o período dos jogos ou ocorrem prévias?

O controle de dopagem é permanente, havendo amostragens “fora de competição”. Isto é feito pelas autoridades de testagem de acordo com seu plano de acompanhamento dos atletas, que envolve inúmeros aspectos esportivos e de coleta de dados de inteligência. Quando um atleta é flagrado com um RAA, a autoridade de controle de dopagem o suspende preventivamente de todas as atividades esportivas. Após o processo legal no âmbito esportivo, sai a pena que o atleta terá de cumprir, descontados os dias em que passou suspenso preventivamente.

Quanto tempo determinada substância proibida permanece no organismo após sua utilização?

Não é possível determinar. O que se encontra em compêndios de farmacologia e toxicologia não se aplica ao controle de dopagem. As técnicas de análises são mais sensíveis que as usuais e assim a capacidade de detecção é muito maior. Além disso, cada organismo tem o seu metabolismo, as drogas se distribuem em diversos compartimentos do corpo (por exemplo, na gordura) e assim são liberadas sem uma previsibilidade. A própria forma de treinar e competir altera isso. Portanto, é importante ressaltar que as curvas de excreção clássicas que interessam à farmacologia e medicina não se aplicam ao contexto do controle de dopagem.

Há cosméticos e medicamentos de uso corriqueiro que possuem em suas formulas substâncias proibidas para os atletas. Que substâncias são essas e quais produtos mais conhecidos têm essas características?

São inúmeros casos e, por isso, um atleta só deve entrar em contato com alguma substância após a aprovação pelo seu médico especializado em medicina do esporte e versado nos produtos permitidos.

iStock

Os ganhos momentâneos de performance obtidos por atletas que se dopam podem se converter em problemas de saúde, como AVCs e cânceres

Uma vez que as substâncias proibidas parecem ser apenas um entre os vários componentes de um medicamento, bebida ou cosmético, em que medida elas podem influenciar na performance? Por exemplo, que ganho teria um atleta que usou um creme cicatrizante que tem em sua fórmula a substância clostebol?

Talvez nenhum. O problema é que não há como saber se uma pequena quantidade identificada na urina do atleta vem de uma aplicação recente de Novaderm [pomada cicatrizante) ou de um uso feito há alguns meses do anabolizante com finalidade de obter massa muscular. Por isso, o regulamento é estrito: qualquer quantidade encontrada de substância exógena é considerada um Resultado Analítico Adverso.

Especificamente no caso de medicamentos que possuem componentes proibidos, que opções de tratamento o atleta terá se ficar doente em período próximo à competição?

O seu médico saberá as alternativas. Na inexistência, desde que claramente comprovado o problema de saúde, o atleta poderá solicitar uma permissão especial ao painel médico da entidade que fará o controle de dopagem da competição. Nesses casos, o atleta deve solicitar uma “isenção para uso terapêutico”.

Como a legislação antidoping trata as tradições culturais? Por exemplo, na Bolívia e no Peru, para atenuar os efeitos da falta de oxigênio decorrente das elevadas altitudes, a população tem o hábito de mascar e tomar chá feito com folhas de coca. Também é possível encontrar nessas regiões produtos industrializados – como balas, cremes dentais, pomada para artrite e xaropes – que incluem essas folhas em suas formulações. Atletas vindos desses países ou os estrangeiros que tiveram passagem por lá têm um tratamento diferenciado?

Esse caso específico é indiretamente considerado quando a WADA determina que, para certas substâncias, há um limite mínimo a ser relatado pelo laboratório, o que elimina esses casos. Hoje, praticamente todos os países (creio que já são mais de 170) já assinaram a convenção internacional da UNESCO comprometendo-se a adotar integralmente o Código Mundial Antidopagem da WADA. Portanto há uma única legislação internacional e todos os países têm de se adaptar a ela.

É somente a ignorância ou a crença de serem poucas as chances de serem pegos que levam os atletas a se doparem?

Os atletas são levados a usar, no meu entendimento, por desespero de causa. A sociedade criou um enorme mecanismo de pressão psicológica sobre eles, que não querem “apenas” ganhar a medalha e subir ao pódio. Hoje, atletas são profissionais e vislumbram a possibilidade de ascensão social meteórica e pagamentos milionários. Mas o pior é que são pressionados também por familiares, treinadores, empresários, clubes etc. Portanto, são inúmeros segmentos da sociedade que atualmente dependem do desempenho do atleta, o que acaba levando o mesmo a tomar atitudes extremas.



LBCD integra conjunto de laboratórios do IQ-UFRJ


Localizado no Polo de Química da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), o Laboratório Brasileiro de Controle de Dopagem (LBCD) é um dos integrantes do Laboratório de Apoio ao Desenvolvimento Tecnológico (Ladetec), mantido pelo Instituto de Química daquela universidade.

Atualmente, o LBCD conta com uma equipe formada por cerca de 80 profissionais, entre professores, pesquisadores e técnicos especialistas em operações de controle de dopagem. Em maio de 2015, após um rígido programa de testes e auditoria, o LBCD foi recredenciado pela Agência Mundial Antidopagem (WADA-AMA) para atuar nas Olimpíadas e Paralimpíadas de 2016.

O vídeo a seguir, produzido pela Autoridade Brasileira de Controle de Dopagem, fornece informações básicas acerca do controle de dopagem no esporte e também sobre a atuação do LBCD.





Relação de Matérias                                                                 Edições Anteriores

 

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