Farmácia - Químicos se mobilizam para evitar perda de mercado de trabalho
Está em vigor desde dezembro de 2002 uma resolução do Conselho Federal de Farmácia (CFF) que praticamente impede os profissionais da química – bem como integrantes de outras categorias profissionais, como administradores de empresas, contabilistas, biólogos etc – exercerem determinados cargos nas empresas do setor. A resolução, de nº 387, classifica como função privativa do farmacêutico atividades como analistas e chefia, gerência e direção de laboratório, produção, controle de qualidade etc. Até mesmo funções que não têm a ver diretamente com a formação dos químicos ou farmacêuticos, como PCP (Programação e Controle da Produção), controle de estoque, de materiais e marketing, são sugeridas pela resolução como atividades exclusivas dos profissionais da farmácia.
Apesar de ter sido publicada no final do ano passado, a resolução só começou a tumultuar o mercado de trabalho nos últimos dois meses. Depois de ter recebido diversas reclamações de empresas e profissionais que foram autuados pela fiscalização do Conselho Regional de Farmácia de São Paulo (CRF-SP), o CRQ-IV promoveu um encontro, no dia 21 de agosto, para avaliar a situação e acabou obtendo informações preocupantes.
Os participantes disseram que, acuadas pelas ameaças do CRF-SP, várias empresas já estudavam substituir seus químicos por farmacêuticos. E tal substituição iria ocorrer mesmo sabendo-se que as atividades desenvolvidas no setor são multidisciplinares e complementativas. Algumas funções atacadas pela resolução, notadamente nas áreas de produção e controle de qualidade físico-químico, sempre foram exercidas por químicos e talvez por isso colaboraram para que o setor atingisse o grau de desenvolvimento que tem hoje. As empresas, contudo, estariam sendo obrigadas a embarcar no vôo cego imposto pela resolução pois, para forçar a substituição dos químicos, o CRF-SP estaria ameaçando negar a liberação de documentos necessários à renovação de licenças junto à ANVISA, o que impediria seu funcionamento.
No mesmo encontro também foram relatados casos de empresas que, para evitar retaliações do CRF-SP, passaram a admitir só farmacêuticos em seus processos de recrutamento. Uma engenheira química com vários anos de experiência no setor contou que, após passar por várias etapas de um processo de seleção, não pôde continuar disputando a vaga porque a empresa acabara de decidir que só farmacêuticos seriam contratados.
O que foi feito até agora
Diante da constatação que a Resolução 387, do CFF, já estava provocando estragos consideráveis, os profissionais que participaram do encontro do dia 21 de agosto decidiram iniciar um movimento para conscientizar e mobilizar a classe química a defender seu mercado de trabalho.
A primeira ação nesse sentido foi elaborar um documento que, após ser assinado pelos profissionais que trabalham na indústria farmacêutica, seria enviado ao Conselho Federal de Química (CFQ) para que aquele órgão tomasse conhecimento da dimensão do problema.
Esse documento foi enviado por carta (veja o conteúdo abaixo) e até o fechamento desta edição mais de 300 profissionais já haviam se manifestado. Juntamente com a carta explicativa, o CRQ-IV remeteu um formulário chamado Ficha de identificação de problema, que deveria ser preenchido por aqueles cujas empresas foram autuadas ou pelo menos pressionadas pelo Conselho Regional de Farmácia - SP a substituir seus químicos por farmacêuticos. As informações colhidas a partir dessas fichas servirão para melhor orientar as ações a serem tomadas.
Na mesma reunião foi formada uma comissão composta por representantes do CRQ-IV, Sindicato dos Profissionais da Química e por químicos que trabalham nas principais indústrias farmacêuticas de São Paulo.
A comissão passou, então, a se reunir aos sábados para analisar as arbitrariedades contidas na Resolução 387, e discutir medidas para a defesa da classe. A partir de um fórum de acesso restrito na Internet, criado à toque de caixa pelo CRQ-IV, o grupo pôde continuar trocando informações durante a semana.
Até o fechamento desta edição, o trabalho da comissão estava praticamente concluído e seria, a pedido do CFQ, encaminhado àquela entidade que se utilizará das análises para embasar as suas ações.
Conselheiros do CRQ-IV, aliás, estiveram no CFQ em setembro e receberam a promessa de que medidas visando preservar os direitos legais dos profissionais seriam adotadas.
Carta enviada em agosto aos profissionais alertando-os sobre os riscos embutidos na Resolução 387 do CFF
São Paulo, 01 de setembro de 2003
Prezado (a) profissional,
Conforme convite que lhe enviamos recentemente, profissionais da química que atuam na indústria farmacêutica reuniram-se na sede do CRQ-IV dia 21 de agosto para discutir os impactos que a Resolução Normativa nº 387, do Conselho Federal de Farmácia (CFF), estaria causando em nosso mercado de trabalho. Depoimentos dados por vários participantes demonstraram que a situação é séria: colegas já foram demitidos e outros estão com seus empregos ameaçados. Alguns que já estão desempregados informaram que, apesar de preencherem todos os requisitos exigidos por empregadores, acabaram sendo eliminados de processos de seleção pelo fato de serem químicos e não farmacêuticos.
Também foram dados depoimentos de que o Conselho Regional de Farmácia de São Paulo estaria retaliando indústrias que, apesar de terem farmacêuticos como responsáveis técnicos, mantém profissionais da química em postos que a citada resolução arbitrariamente diz serem privativos dos farmacêuticos. Para forçar a substituição desses químicos por farmacêuticos, o CRF-SP estaria negando a emissão de certidões e outros documentos necessários para o funcionamento da empresa, renovação de suas licenças em órgãos regulatórios ou participação em licitações.
Em função da gravidade da situação, o CRQ-IV, o Sindicato dos Químicos e os profissionais que estavam na reunião concluíram que se faz necessário uma reação imediata. O primeiro passo nesse sentido será o envio de um manifesto ao Conselho Federal Química pedindo que aquele órgão, o único que tem legitimidade para normatizar o assunto e representar coletivamente a categoria, tome providências para evitar que o quadro piore ainda mais.
Dentre as providências regionais, estamos incluindo desde um entendimento com o CRF no sentido de que a sua fiscalização respeite as atividades afins até, se necessário, recorrer à Justiça e/ou ao Ministério Público pela tentativa de cercear o direito ao livre exercício do trabalho, assegurado pela Constituição. Desde já, os Departamentos Jurídicos do CRQ-IV e do Sindicato dos Químicos estão à disposição para orientar os casos individuais.
Sua participação nessa mobilização é muito importante. Mesmo que você ou a empresa onde trabalhe não tenham sido ameaçados pela fiscalização do CRF, tenha certeza que a ameaça ocorrera em breve. O CRF-SP divulgou na última edição de seu jornal que passou os últimos meses montando estratégia para fazer cumprir a Resolução nº 387, o que significa que mais dia ou menos dia você poderá ser “convidado (a)” a ceder seu lugar a um farmacêutico.
Para participar dessa iniciativa basta preencher o manifesto anexo, assiná-lo e enviá-lo com a maior brevidade ao Departamento Jurídico do CRQ-IV. O endereço é rua Oscar Freire, 2.039 – Pinheiros – SP/SP – CEP 05409-011. Se desejar obter outras informações/orientações, ligue para (0xx11) 3061-6021 ou escreva para juridico@crq4.org.br.
Importante: Se conhecer algum profissional da química que atue em indústria farmacêutica e que não tenha recebido esta carta, comente o problema, faça cópias do manifesto e peça a ele que também participe. E caso você ou sua empresa já estejam com problemas decorrentes da Resolução 387, preencha o formulário Ficha de Identificação de Problema anexo, e envie-o juntamente com a ficha de adesão ao manifesto. Essas informações serão muito importantes para subsidiar eventuais ações.
Conselho Regional de Química IV Região
Sindicato dos Profissionais da Química do Estado de São Paulo
Clique aqui para obter uma cópia no formato Word da carta acima, bem como do Manifesto a ser enviado ao Conselho Federal de Química e da Ficha de Identificação de Problema.