Os CRQs estão investigando o envolvimento dos profissionais que respondiam tecnicamente pelos laboratórios Enila (fabricante do contraste Celobar), Lenssurgical (responsável pelo Methyl Lens Hypac 2%) e Oft Vision (que produzia a solução oftálmica viscoelástica Oft Visc), produtos sobre os quais pesam acusações de terem causado mortes e cegueiras em pessoas de vários estados brasileiros, conforme noticiou amplamente a imprensa. Se forem considerados culpados na esfera administrativa pelos CRQs, esses Responsáveis Técnicos poderão perder o direito de exercer sua profissão por até um ano.
Em situação muito delicada pode ficar o engenheiro químico que responde tecnicamente pelo produtos fabricados pela Oft Vision, sediada na capital paulista. Ele assinou documentos declarando que os lotes de produtos que causaram problemas de visão em pacientes operados de catarata foram liberados para venda sem que antes tivessem passado por testes de esterilidade. Como não atendiam às especificações técnicas de qualidade, provocaram reações extremamente graves.
O caso do Lenssurgical é também bastante sério. Segundo depoimento prestado ao CRQ-IV, o suposto Responsável Técnico pelo Methyl Lens Hypac 2% alegou que seu nome vinha sendo usado indevidamente pelo laboratório, sediado em Campinas (SP). Ele exibiu documentos que mostravam ter sido sócio da firma, mas que também sugeriam que, bem antes dos acontecimentos, já não tinha mais vínculo com a empresa. De fato, o investigado (um técnico em bioquímica) ou a empresa jamais apresentaram documentos ao Conselho que o indicassem para a função de Responsável Técnico. A própria empresa vinha, há tempos, operando ilegalmente, pois nunca solicitou registro na entidade. Conforme solicitado, em julho o CRQ-IV enviou ofício ao Ministério Público Federal prestando essas informações e ressaltando que os fatos apurados indicavam que a empresa estava utilizando rótulos com falsas indicações.
O CRQ-IV também teve uma pequena participação na investigação envolvendo a empresa Enila. Sediada no Rio de Janeiro, ela importava a matéria-prima para fabricação do contraste Celobar, mas decidiu tentar fabricá-la em suas instalações. Um profissional registrado no CRQ-IV envolveu-se nesse processo de fabricação. Esse profissional, aliás, estava em situação totalmente irregular, pois sua condição era de inadimplência e seu endereço era desconhecido. Só depois que o caso ganhou as páginas dos jornais é que se descobriu que ele havia se transferido para o Rio de Janeiro, onde também atuava ilegalmente, já que não procurou o CRQ-III para se regularizar. O profissional está agora sendo investigado por aquele regional.
Além de serem lamentados e condenados por toda a sociedade, casos como esses devem servir de alerta para os profissionais da química que atuam ou pretendem atuar como Responsáveis Técnicos, adverte o diretor executivo do CRQ-IV, Manlio de Augustinis. Ele diz que a sociedade espera muito mais do que uma simples e muitas vezes inócua assinatura de alguém que se propõe a responder pela qualidade e segurança de um produto químico. "Nós somos rigorosos ao avaliar se um profissional indicado para a função de responsável técnico tem formação compatível para aquela atividade, mas muitas vezes não temos como checar se ele de fato está cumprindo com a obrigação de orientar e supervisionar a produção, ou se simplesmente está vendendo a sua assinatura", explicou, completando que seria necessário manter um fiscal em cada uma das mais de oito mil empresas registradas para verificar isso.
Manual
O diretor do CRQ-IV disse que é preciso acabar com a cultura do querer ganhar sem trabalhar ou de se submeter às ordens que visam exclusivamente o lucro em detrimento da aplicação correta dos procedimentos técnicos. Seja numa empresa que fabrica produtos de limpeza, seja num laboratório que produz medicamentos, o Responsável Técnico nunca poderá se esquecer que o destinatário final daquele produto será sempre o ser humano. Negligenciar essa verdade é o mesmo que virar as costas para a vida, ressaltou Augustinis. O executivo garantiu que esses casos, assim como todos os outros que chegarem ao conhecimento do Conselho, serão apurados e, se for comprovada má-fé ou inabilidade, os químicos responsáveis técnicos serão duramente punidos e ainda poderão ser processados civil e criminalmente pelo Ministério Público.
Em setembro do ano passado, o CRQ-IV editou um livrete chamado Manual de Responsabilidade Técnica. Além de distribuir a publicação aos profissionais que passaram a assumir essa função, também disponibilizou o material em seu site para todos os interessados. Clique aqui para obter uma cópia.
Escrito numa linguagem simples e direta, o manual dá todas as dicas de como o profissional deve proceder e até traz uma relação de perguntas que freqüentemente são enviadas ao CRQ-IV. O Responsável Técnico tem obrigação de conhecer o manual, não podendo jamais poderá alegar ignorância quanto ao seu conteúdo. Uma punição por ferir o Código de Ética da categoria pode comprometer toda uma carreira e condenar o profissional ao ostracismo.