O registro dos Engenheiros Químicos nos CRQs
Autor(a): por Manlio de Augustinis
Durante anos vem se arrastando a discussão sobre em qual órgão os Engenheiros Químicos devem se registrar: CRQ ou CREA? Mesmo tendo sido exarados vários pareceres jurídicos, realizados mutos debates e publicados mais de uma dezena de artigos a respeito, nos permitimos voltar ao tema para expor a nossa opinião de forma ordenada, abordando aspectos históricos, técnicos e legais.
De início, é necessário definir alguns conceitos:
Química - É a ciência que estuda as propriedades das substâncias e as Leis Naturais que regem suas transformações.
Tecnologia Química - É um conjunto de conhecimentos que permite a promoção e o domínio dos fenômenos que obedecem as Leis Naturais, as que regem a transformação da matéria, para usufruto e benefício do homem.
Engenharia Química - Conjunto de conhecimentos qualitativos e quantitativos dos atributos técnicos, econômicos e financeiros que proporcionam uma melhor otimização e racionalização na utilização da Tecnologia Química.
Conversão Química - Sistema de uma ou mais reações químicas, científica e tecnicamente viáveis em escalas piloto e industrial e economicamente viável em escala industrial.
Operações Unitárias - São operações onde ocorrem transformações físicas e/ou físico-químicas, realizadas em equipamentos específicos, tanto em escala piloto como industrial, que por meio da aplicação dos fenômenos de transporte permitem e complementam: a) a otimização e interação das conversões químicas nos processos industriais; b) a preparação das matérias-primas a serem processadas; c) a otimização e racionalização energética dos processos; d) a separação e/ou purificação dos produtos intermediários e/ou finais dos processos; e) o controle e tratamento de efluentes sólidos, líquidos e gasosos.
Indústria Química - É o ramo de atividade que utiliza, preponderantemente, processamento industrial constituído por um conjunto de conversões químicas e/ou operações unitárias seqüenciais de causa e efeito, onde está envolvida a Tecnologia Química, com a finalidade de transformar matérias-primas em produtos industriais de interesse econômico, social e/ou militar.
Legislação
O Decreto nº 24.693, de 27/07/34, primeira lei a regulamentar as atividades químicas em nosso País, determinou em seu artigo 4º. que: "O exercício da profissão de químico compreende: (...) d) a Engenharia Química.
A chamada Lei de Introdução ao Código Civil (Decreto nº 4.657, de 04/09/42), estabelece em seu artigo 2º que: 1º - A Lei posterior revoga a anterior quando, expressamente o declare, quando seja com ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior; 2º – A Lei nova que estabelece disposições gerais ou específicas a par das existentes, não revoga nem modifica a lei anterior.
A Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, criada pelo Decreto 5.452, de 01/05/43, dedicou seus artigos de 325 a 351 aos profissionais da Química, incluindo entre eles os Engenheiros Químicos e confirmando ser a Engenharia Química atividade da área da Química.
Os Conselhos de Química foram criados pela Lei 2.800, de 18/06/56, que conferiu a essas entidades a competência de fiscalizar as atividades de sua área. Determinou, ainda, que os Engenheiros Químicos, quando exercerem atividades na área da Química, devem se registrar nos CRQ's. A mesma Lei também incluiu os Engenheiros Industriais modalidade Química no rol dos profissionais da Química.
A profissão de engenheiro foi regulamentada pela Lei 5.194, de 24/12/66. Em nenhum momento ela menciona a Engenharia Química ou afirma que o Engenheiro Químico deve se registrar nos CREAs. Tal menção só foi feita até hoje por Resoluções Normativas (RN) publicadas pelo CONFEA - Conselho Federal de Engenharia e Arquitetura. Como se sabe, uma RN não se sobrepõe a uma Lei.
Dois anos depois, em 13/11/68, a Lei 5.530 confirmou serem profissionais da Química todos os mencionados na Lei 2.800, mantendo entre eles os Engenheiros Químicos e Engenheiros Industriais modalidade Química.
A regulamentação da Lei 2.800 veio com o Decreto 85.877, de 07/04/81. Explicitamente, esse decreto estabeleceu quais são as atividades do Engenheiro Químico e determinou, inclusive, quais as que lhes são privativas.
Embasamento histórico
Os cursos mais tradicionais da Engenharia Química (veja quadro) foram organizados a partir da estrutura existente dos cursos de Química Industrial. A Escola Nacional de Química do Rio de Janeiro, pertencente a então Universidade do Brasil (hoje Universidade Federal do Rio de Janeiro), instalou, em 1933, o curso de Química Industrial que serviu de base para a organização do curso de Engenharia Química, inaugurado em 1952.
Outro exemplo é o das Faculdades Oswaldo Cruz. Maior formadora de profissionais da Química, essa instituição paulistana também estruturou seu curso de Engenharia Química a partir do curso de Química Industrial, confirmando a interação entre essas duas áreas.
Primeiros Cursos de Engenharia Química e Química Industrial no Brasil
1915
Curso de Química Industrial – Escola de Engenharia Mackenzie
1920
Curso de Química Industrial – Escola de Engenharia do Rio Grande do Sul.
1920
Curso de Química Industrial – Escola de Engenharia de Pernambuco.
1921
Curso de Química Industrial – Escola Politécnica de São Paulo
1924
Curso de Química Industrial – Faculdade de Engenharia do Paraná (Curitiba).
1925
Curso de Engenharia Química – Escola Politécnica de São Paulo.
1928
Curso de Engenharia Química – Instituto Militar de Engenharia – Rio de Janeiro.
1933
Curso de Engenharia Industrial Modalidade Química – Escola de Engenharia Mackenzie.
1933
Curso de Química Industrial – Escola Nacional de Química (Rio de Janeiro).
1946
Curso de Engenharia Química – FEI – Faculdade de Engenharia Industrial (São Paulo).
1952
Curso de Engenharia Química – Escola Nacional de Química (Rio de Janeiro).
1953
Curso de Engenharia Química – Escola de Engenharia de Pernambuco.
1953
Curso de Engenharia Química – Faculdade de Engenharia do Paraná.
1955
Curso de Engenharia Química – Escola de Engenharia do Rio Grande do Sul
Embasamento técnico
Considerando os conceitos expostos, podemos, certamente, afirmar que: a) As industrias químicas utilizam preponderantemente a Tecnologia Química, o que contraria o que vem sendo apregoado por uma minoria que diz ser a Engenharia Química a atividade básica dessas empresas; b) O Engenheiro Químico deve ter sólida formação em química e profundos conhecimentos de Tecnologia Química para desenvolver atividades de projeto, supervisão, condução, controle, etc, relacionadas com a indústria química; c) A utilização das leis básicas da Física e da Matemática, comuns aos demais ramos da engenheira, permitem ao Engenheiro Químico contribuir para uma melhor otimização e racionalização na aplicação da Tecnologia Química.
Embasamento Legal
Sob o ponto de vista legal temos a considerar que:
A CLT e a Lei 2.800/56 determinam que a Engenharia Química é uma atividade química e que o Engenheiro Químico, como profissional da Química, deve se registrar no CRQ;
A afirmação, muito usada pelo CONFEA, de que a Lei 5.194/66, (que regulamenta a profissão de engenheiro), revogou a Lei 2.800, é improcedente, posto que ela sequer menciona os Engenheiros Químicos ou a Engenharia Química. As matérias de que tratam as duas Leis são diferentes;
A Lei 5.194 estabelece disposições gerais e específicas em relação à CLT e à Lei 2.800 e, portanto, conforme o parágrafo 2º do Decreto 4.657, não as revoga;
A Lei 5.530/68, posterior a Lei 5.194/66, reafirma serem profissionais da Química todos aqueles mencionados na Lei 2.800, o que evidencia que esta não foi revogada;
Se a Lei 5.194/66 tivesse revogado a Lei 2.800, então, o Decreto 85.877/81, que regulamenta esta última, não poderia ter sido promulgado.
Todos esses argumentos não permitem outra conclusão senão a de que o Engenheiro Químico é sim um profissional da Química, estando, portanto, obrigado a manter registro profissional nos CRQs.
O auto é diretor executivo do CRQ-IV. Contatos podem ser feitos pelo e-mail diretoria@crq4.org.br.