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Nov/Dez 2009 

 


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Nobel - As bases atômicas da vida
Autor(a): por Antonio Carlos Massabni


No início do século XX, a fundamentação química para explicar a vida era um mistério. Hoje, nós sabemos como funciona a maioria dos processos vitais no nível do átomo. O prêmio Nobel em Química 2009 foi concedido ao mapeamento detalhado do ribossomo – a “fábrica” de proteínas da célula. O ribossomo traduz a informação do DNA em forma e função.

A teoria geral da evolução, publicada por Charles Darwin em 1859, é baseada no conceito de que as características dos organismos vivos são hereditárias, mas podem ocorrer alterações casualmente.

Quando a comunidade científica compreendeu e adotou os pensamentos de Darwin, algumas questões novas surgiram: o que exatamente está sendo transferido de geração a geração? Onde ocorrem alterações casuais? Como estas alterações se manifestam nos organismos vivos?

O Nobel de Química 2009 é o terceiro de uma série de prêmios a mostrar que as teorias de Darwin realmente funcionam no nível do átomo. Fotografias geradas por meio de técnicas de raios-X mostram como o código genético pode se manifestar não só como músculos, ossos e pele, ou audição, sentimento e sabor, mas também como pensamentos e linguagem.

A trilogia começou com um dos mais famosos prêmios Nobel de todos os tempos, o de 1962, quando James Watson, Francis Crick e Maurice Wilkins foram reconhecidos pelo seu trabalho na elucidação da estrutura da molécula de dupla hélice do DNA. O segundo prêmio da trilogia foi conferido em 2006 a Roger D. Kornberg pelas estruturas de raios-X que explicam como a informação é transferida para a molécula mensageira do RNA.    

O ribossomo transforma a informação genética em ação

Os três ganhadores do Prêmio Nobel de Química 2009 foram Ada E. Yonath, Thomas A. Steitz e Venkatraman Ramakrishnan. Eles mapearam o ribossomo – uma das “máquinas” mais completas da célula – no nível atômico. O ribossomo lê a informação do RNA mensageiro e, com base nessa informação, produz a proteína. Cientificamente, esta operação é conhecida como “tradução”.

É durante este processo de transferência, quando a interação DNA/RNA produz a proteína, que a vida acontece. O corpo contém dezenas de milhares de proteínas diferentes que controlam tudo o que acontece com surpreendente precisão. Exemplos dessas proteínas: hemoglobina, que transporta oxigênio dos pulmões para o todo o corpo; insulina, que controla o nível de açúcar no sangue; anticorpos que combatem vírus intrusos; queratina, que fabrica cabelos e unhas.

Os ribossomos existem em todas as células de todos os organismos vivos, das bactérias aos seres humanos. Como nenhum ser vivo pode sobreviver sem ribossomos, eles são os alvos perfeitos para os medicamentos. Muitos dos antibióticos modernos atacam os ribossomos das bactérias, mas deixam os ribossomos das células humanas livres. As descobertas dos ganhadores do Prêmio Nobel deste ano abrem perspectivas para o desenvolvimento de novos antibióticos.

Os laureados de 2009

Ada E. Yonath nasceu em Jerusalém e trabalha no Instituto de Ciências Weizmann, em Israel. No final de 1970, Ada decidiu tentar gerar estruturas do ribossomo utilizando a difratometria de raios-X, o que foi considerado impossível por muitos na época.

O ribossomo é uma estrutura complicada que envolve proteínas e RNA. Ele é dividido em duas subunidades. A subunidade menor em um ribossomo humano consiste da molécula de RNA e cerca de 32 proteínas. A subunidade maior consiste de três moléculas de RNA e cerca de 46 proteínas. Cada uma das subunidades é constituída, portanto, de milhares de nucleotídeos e milhares de aminoácidos, formados por dezenas de milhares de átomos.

Ada Yonath queria localizar cada átomo do ribossomo. Quando decidiu cristalizar o ribossomo, ela escolheu a bactéria Geobacillus stearothermophilus, que tem capacidade de sobreviver em temperatura ambiente acima de 75ºC.

Para Ada, o ribossomo tinha que ser muito estável para formar os melhores cristais para as medidas de raios-X. Em 1980, ela já tinha conseguido os primeiros cristais tridimensionais da unidade maior do ribossomo. Levou mais uns 20 anos de trabalho para a geração da imagem do ribossomo, o que lhe permitiu determinar a posição de cada átomo. A estabilização dos cristais em nitrogênio líquido foi obtida a -196ºC.

Aos poucos, Ada foi conseguindo seu objetivo, tendo contado com a ajuda dos dois cientistas que acabaram compartilhando com ela o Prêmio Nobel deste ano.

No início de 1990, Ada conseguiu cristais de boa qualidade para determinar a estrutura do ribossomo, mas ainda havia problemas técnicos a serem resolvidos.

Coube a Thomas Steitz resolver tais problemas. Usando imagens do ribossomo geradas por microscopia eletrônica, foi possível descobrir como os ribossomos estavam orientados e localizados no cristal.

Natural de Milwaukee (EUA) e professor da Universidade de Yale, Steitz publicou, em 1998, a primeira estrutura cristalina da subunidade maior do ribossomo. Não foi possível localizar os átomos individualmente, mas as moléculas do RNA do ribossomo podiam ser visualizadas. Resolvido parcialmente o problema, era necessário melhorar a qualidade dos cristais e colher mais dados para melhorar a qualidade das imagens de raios-X.

Com a publicação de outras estruturas cristalinas similares no ano de 2000, foi possível melhorar a resolução e localizar os átomos na estrutura do ribossomo.

Além de Thomas e Ada, o indiano naturalizado norte-americano Venkatraman Ramakrishnan, do Laboratório de Biologia Molecular de Cambridge, Inglaterra, também colaborou para obter a estrutura da unidade menor do ribossomo da bactéria Thermus thermophilus. Assim, foi possível mapear o ribossomo no nível atômico.

Ribossomos: o alvo para novos antibióticos

Hoje, os seres humanos dispõem de um arsenal de antibióticos diferentes que podem ser usados na luta contra as doenças geradas por bactérias. Muitos desses antibióticos matam as bactérias, bloqueando a atividade de seus ribossomos. Entretanto, as bactérias acabam se tornando resistentes à maioria dessas drogas rapidamente. É fundamental, portanto, que se trabalhe para a descoberta de novos antibióticos.

Neste ano de 2009, os três laureados com o Prêmio Nobel em Química determinaram e identificaram estruturas que mostram como diferentes antibióticos podem se ligar aos ribossomos. Alguns antibióticos bloqueiam o caminho através do qual as proteínas saem do ribossomo e outros antibióticos bloqueiam a formação de ligação peptídica entre aminoácidos. Outros antibióticos, ainda, impedem a transcrição da mensagem DNA/RNA na proteína.

Algumas empresas usam, atualmente, as estruturas dos ribossomos para desenvolver novos antibióticos. Há empresas que estão desenvolvendo, também, testes clínicos para resolver os problemas causados pelas bactérias multirresistentes. 

Professor aposentado do Instituto de Química da
Unesp/Araraquara, o autor é conselheiro suplente do CRQ-IV e um dos coordenadores da seção QuimicaViva do site do CRQ-IV.

Contatos pelo e-mail amassabni@uol.com.br.





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