Líquido de coloração amarelada, tóxico e de alto potencial poluidor, a manipueira é um resíduo gerado na prensagem da mandioca durante a industrialização de produtos derivados desta planta e que pode causar forte impacto ambiental. O que caracteriza o alto potencial poluidor da manipueira é sua elevada taxa de DBO (Demanda Bioquímica de Oxigênio – Quanto maior a DBO, mais poluente é o resíduo) e alta concentração de ácido cianídrico. Por desconhecimento do problema e também para reduzir custos, muito produtores ainda lançam tal resíduo em lagoas de decantação ou em corpos d’água sem qualquer tratamento.
O processo de produção de farinha de mandioca é bem simples, quase que totalmente artesanal, ocorrendo, na sua maioria, em pequenas propriedades rurais. Já o processo de produção de fécula de mandioca é mais sofisticado, pois envolve processo tipicamente industrial. Com área plantada de aproximadamente 60 mil hectares e produção de 33 toneladas por hectare, o Estado de São Paulo é o terceiro maior produtor nacional de mandioca, segundo levantamento feito em 2010 pela Associação Brasileira dos Produtores de Amido e Mandioca. A região de Assis é a maior fornecedora para a indústria.
Preocupados com a geração de manipueira, sua destinação e as dificuldades técnicas e financeiras que as empresas do setor vinham enfrentando para solucionar o problema, a Associação dos Produtores de Mandioca e Derivados do Estado de São Paulo (Apmesp), com sede em Cândido Mota, e o Conselho Regional de Química IV Região firmaram um acordo que permitiu a contratação de profissionais da química da própria região para atuarem nas fábricas. A partir de então, começaram a ser implementadas melhorias em todas as etapas do processo, desde o recebimento da matéria-prima, passando pela qualidade do produto final e pelo tratamento e aproveitamento dos resíduos gerados.
A manipueira gerada no processo de fabricação dos produtos de mandioca não pode ser descartada em rios ou lagoas, pois pode provocar a eutrofização do meio, colocando em risco a vida destes ecossistemas. O assunto é tão preocupante que recentes pesquisas sobre a manipueira têm alertado sobre a necessidade de atuação dos órgãos do sistema público de saúde no sentido de monitorarem os locais de despejos do resíduo, evitando assim que os moradores próximos venham a adquirir intoxicações, já que este resíduo pode ser usado como pesticida. Neste contexto, vale citar alguns trabalhos importantes, tais como os produzidos por: Armínio Santos (aluno do Doutorado em Planificación Territorial e Gestión Ambiental da Universidade de Barcelona com Mestrado em Desenvolvimento Sustentável pela Universidade de Brasília, UNB, Brasil), Ailton Barboza de Souza (Engenheiro Químico, Mestre em Tecnologia Química de alimento) e Urivald Pawlowsky (Engenheiro Químico e professor da Universidade Federal do Paraná) entre outros, e também pesquisas realizadas pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, (Embrapa) que visam o aprimoramento do sistema de produção e o aproveitamento sustentável da manipueira.
A manipueira possui as seguintes características pH = 4,6; Dureza Total (ppm) = 1500; Brix = 7,8; Acidez = 12,8 mL NaOH/100g ou mL de produto; condutividade (µS/cm a 25°C) = 7,03; Turbidez (NTU) = 2000; Cinzas 500°C (% m/v) = 0,54; DBO (ppm) 243 e DQO (ppm) = 63,5. Apresenta, ainda, em sua composição macronutrientes, tais como: Potássio, Nitrogênio, Magnésio, Fósforo e Cálcio. Assim como qualquer outro efluente, a manipueira deve se enquadrar dentro das especificações de acordo com a legislação ambiental.
Os Químicos responsáveis pelas indústrias estão atentos a isso e trabalham no sentido de aprimorar o processo produtivo e adequá-lo às normas de higiene, boas práticas de fabricação, destinação de resíduos e princípios do desenvolvimento sustentável. Nesta linha, eles vêm implantando um sistema de coleta da manipueira para ser utilizada como adubo na própria lavoura da mandioca, pelo método da fertirrigação, e também como fonte de açúcares para uma fermentação visando à produção de álcool.
Outros usos - Pesquisas envolvendo o aproveitamento da manipueira trazem outras soluções para o resíduo, como fabricação de sabão, vinagre e de pesticidas. As fábricas de farinha de mandioca Ubirajara e Mandiovitta, localizadas respectivamente nas cidades paulistas Ubirajara e Parapuã, são exemplos de responsabilidade quanto ao uso da manipueira como matéria-prima para fabricação de álcool e fertilizante.
A Ubirálcool é uma unidade criada dentro da Fábrica de Farinha de Mandioca e Derivados Ubirajara que utiliza, além da mandioca in natura como matéria-prima, todos os resíduos da produção de farinha de mandioca para a fabricação de álcool.
Como se observa, o acordo entre o CRQ-IV e a Apmesp possibilitou que as pequenas empresas do setor passassem a contar com a assistência de profissionais químicos, que com seus conhecimentos vêm modernizando a produção, gerando maiores ganhos às empresas e contribuindo para evitar a degradação do meio ambiente.
Químico Industrial com Mestrado em Química dos Recursos Naturais (UEL-PR), o autor trabalha no convênio Apmesp/CRQ-IV desde 2006.
Contatos pelo e-mail msferreiraquimico@bol.com.br
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