Casulo do bicho-da-seda pode reduzir até 25% do custo de enxertos ósseos
Pesquisadores do Instituto de Química de São Carlos (IQSC) da USP desenvolveram um biomaterial que combina hidroxiapatita (fosfato de cálcio) com uma proteína encontrada no casulo do bicho-da-seda, a fibroína. A mistura possui características químicas e estruturais próximas às dos ossos trabeculares, que são encontrados no interior dos ossos longos e representam cerca de 20% do esqueleto humano.
O biomaterial é resistente, biodegradável e biocompatível e foi produzido pela pesquisadora Daniela Vieira (que atualmente realiza doutorado na Universidade McGill, em Montreal, no Canadá), e seu orientador no mestrado feito no IQSC-USP, o professor Sérgio Yoshioka, utilizando uma técnica mais simples, rápida e barata que as disponíveis no mercado, o que pode reduzir o custo de enxertos ósseos em até 25%.
O diferencial da tecnologia é a forma como esta foi obtida, por meio de uma técnica chamada coprecipitação. No método, a fibroína da seda é dissolvida em uma solução líquida com cálcio, principal componente da hidroxiapatita. Então, amostras de fosfato são adicionadas à mistura e, após algumas reações químicas, o material é seco e prensado em forma de blocos, com a hidroxiapatita já incorporada à fibroína da seda.
Todas essas etapas são realizadas a temperatura ambiente, sendo necessárias cerca de 24 horas para a formação de alguns blocos. A pesquisa foi realizada no âmbito do Programa de Pós-Graduação em Bioengenharia, oferecido em conjunto pelo IQSC, Escola de Engenharia de São Carlos (EESC) e Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP.
Henrique Fontes/IQSC |
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Processo de obtenção dos blocos de hidroxiapatita e fibroína de seda é econômico e sustentável |
Diversos trabalhos científicos realizados atualmente estudam a combinação de hidroxiapatita e fibroína de seda, mas em diferentes formatos, como gel e esponjas, que possuem texturas menos resistentes em comparação com os blocos desenvolvidos. Além disso, na maioria das pesquisas são utilizadas técnicas “secas” (reações no estado sólido) de produção, que demandam constante e elevado aquecimento térmico, com temperaturas que alcançam os 1.200 ºC, acarretando aumento no custo final do material, que pode ficar até 25% maior. Esse procedimento também aumenta o tempo de fabricação do produto, podendo levar aproximadamente quatro dias para que um único bloco seja finalizado. Outra vantagem dos chamados “métodos úmidos”, como o proposto por Daniela, é que eles apresentam melhor controle da morfologia e dos tamanhos das partículas formadas.
Arquivo pessoal
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Daniela Vieira, do IQSC-USP, é autora da pesquisa
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O professor Sérgio Yoshioka revela que o novo biomaterial também já começou a ser testado em camundongos e os dados preliminares têm mostrado eficácia. O especialista produzirá ainda cerca de 100 blocos para a realização de testes complementares, que deverão ser aplicados futuramente em porcos e bois.
A estimativa é de que o produto esteja disponível no mercado em um ano, para uso veterinário, e em dois para utilização em humanos. Para agilizar esse processo, foi firmada uma parceria com a iniciativa privada para a finalização e comercialização do enxerto, que ficará por conta da JHS Biomateriais S.A., de Sabará (MG), que financiou parte do trabalho e ofereceu uma bolsa de estudos de três meses para Daniela durante a realização da pesquisa, defendida em seu mestrado na USP. A cientista também foi bolsista da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).
Os bons resultados apresentados pelo biomaterial até o momento também se devem ao fato dele ter demonstrado alto índice de porosidade, com níveis de até 70%. Essa característica permite a distribuição de oxigênio e nutrientes pelo composto, facilitando a integração vascular e a incorporação das células ósseas presentes no local de implantação do enxerto. A expectativa dos cientistas é de que o material ajudará na formação de um novo tecido estimulando a produção celular e, com o tempo, irá se degradar no organismo. Todo esse processo pode durar de 3 a 12 meses, dependendo do paciente e da complexidade do dano sofrido.
Daniela e Sérgio afirmam que o novo material desenvolvido no IQSC também pode ser aproveitado em outras aplicações médicas, como em reparos de cartilagens e pele, desde que sejam realizadas alterações em sua parte física, buscando a viscosidade e o formato adequados. A tecnologia também pode ser utilizada como fertilizante para liberação controlada de cálcio e fosfato para plantas, sem presença de contaminantes prejudiciais aos vegetais, ou ainda como material para produção de placas cerâmicas em substituição a materiais metálicos.
Com informações do Jornal da USP e da Assessoria de Comunicação do IQSC
Publicado em 19/06/2020
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