Técnica simplifica monitoramento de medicamentos no organismo
Jerzy Gorecki/Pixabay |
|
|
Método desenvolvido por Químicos de São Carlos simplifica a verificação de concentração de medicamentos no organismo |
Um novo método desenvolvido por cientistas do Instituto de Química de São Carlos (IQSC) da USP promete simplificar o processo para detectar a presença e determinar a concentração de medicamentos no organismo de uma pessoa. Além de ser mais rápida e barata, a técnica exige uma quantidade bem menor de amostras de urina, sangue ou saliva de alguém que precisa passar por exames médicos. O procedimento pode ser um importante aliado dos profissionais da saúde no tratamento de pacientes acometidos por diversos tipos de doenças e até mesmo em perícias no caso de intoxicações por uso abusivo de fármacos ou mortes por overdose. Os resultados obtidos no trabalho geraram um artigo que foi publicado na Molecules, revista científica internacional da área de química.
A metodologia foi aplicada em amostras de urina humana para identificar cinco tipos de antidepressivos e antiepiléticos muito utilizados no Brasil: Carbamazepina, Citalopram, Desipramina, Sertralina e Clomipramina. Segundo os cientistas, monitorar a concentração de medicamentos presentes no organismo é importante, por exemplo, para avaliar a eficácia de um tratamento. Se o paciente excreta uma porcentagem muito alta de certo remédio pela urina, isso pode explicar o fato do composto não estar surtindo efeito, permitindo que o médico mude a estratégia da terapia. Outro motivo que mostra a relevância de se realizar esse tipo de avaliação na área médica é que, nas últimas décadas, o uso excessivo de alguns fármacos para fins recreativos tem preocupado organizações de saúde em todo o mundo. Esse hábito pode causar graves problemas de intoxicação, o que demanda análises precisas dos medicamentos ingeridos pelo usuário no caso de algum incidente.
Como funciona o método? – Primeiramente, a amostra a ser analisada passa por uma espécie de filtro para eliminar algumas impurezas que podem interferir no resultado. Depois disso, a porção de urina é colocada dentro de um equipamento (cromatógrafo líquido) onde um robô suga parte da amostra para que ela seja misturada com os solventes, compostos que ajudam a transportá-la até tubos bem finos, responsáveis por reter e separar os medicamentos. Após essa etapa, os fármacos são encaminhados para outro aparelho, chamado espectrômetro de massas, que realiza a identificação e quantificação dos remédios. Todo esse processo é desenvolvido, otimizado e repassado previamente pelos cientistas a um computador, que executa as tarefas de forma automática.
“Diferentemente dos métodos tradicionais, que envolvem uma série de procedimentos manuais trabalhosos e demorados para preparar as amostras, nós conseguimos automatizar o processo, eliminando diversas etapas. Isso fez com que o tempo de análise caísse pela metade, passando de aproximadamente 16 minutos no método convencional para cerca de oito minutos com o nosso método. Além disso, é possível realizar e controlar todo esse passo a passo a distância, direto das nossas casas, por exemplo, tornando o procedimento muito mais flexível”, explica Edvaldo Vasconcelos Soares Maciel, autor do trabalho e doutorando do IQSC.
O pesquisador conta que a nova metodologia pode ser adaptada para monitorar e detectar qualquer tipo de medicamento ou produto ingerível em outros tipos de fluidos biológicos, como a saliva e o sangue, e até mesmo ser utilizada em outras áreas, como meio ambiente e no ramo alimentício – os cientistas, inclusive, já testaram o método para avaliar a presença de agrotóxicos no mel produzido por abelhas e de toxinas no vinho. Outro benefício da técnica é que ela demanda uma quantidade bem menor de solventes e amostras para que a detecção dos compostos de interesse seja feita, barateando o processo: “Pensando em um exame que exige a coleta de sangue do paciente, ou seja, um procedimento invasivo, é interessante que retiremos a amostra rapidamente, na menor fração possível, evitando ao máximo qualquer desconforto. Já com relação aos solventes, com apenas uma gota já conseguimos realizar a análise, quantidade aproximadamente 100 vezes menor que a utilizada nos métodos tradicionais”.
Um outro item que também possibilitou o barateamento das análises foi o desenvolvimento dos pequenos tubos utilizados durante o processo de separação, detecção e quantificação dos medicamentos. Feitos de óxido de grafeno e sílica (principal componente da areia), os dispositivos criados no IQSC são mais finos que os convencionais e possuem um custo bem menor que os encontrados no mercado. De acordo com o professor Fernando Mauro Lanças, docente do IQSC e orientador de Edvaldo, a redução de custos pode beneficiar, principalmente, a indústria, que muitas vezes realiza experimentos 24 horas por dia. Lanças afirma ainda que a utilização de quantidades menores de solventes, além de gerar benefícios econômicos, também contribui para o estímulo da sustentabilidade, já que o excedente desses compostos, que geralmente são nocivos e tóxicos ao meio ambiente, é descartado. “Muito maior do que o preço que se paga para comprar esses solventes são os gastos para dar um destino adequado a eles, que não podem ser jogados em qualquer lugar. Então, uma vez que nós trabalhamos com quantidades menores desses materiais, obviamente teremos menos produtos para descartar, deixando o processo mais ecológico”, explica.
O método desenvolvido no IQSC já foi validado e está pronto para ser incorporado à indústria ou transferido para hospitais que desejarem utilizá-lo. O trabalho foi financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES).
Reportagem de Henrique Fontes,
da Assessoria de Comunicação do IQSC/USP
Publicado em 18/06/2021
Voltar para a relação de notícias