A corrida do alumínio
Maria Manuela Machado de Moraes*
Na terceira linha da Tabela Periódica, no grupo 13, encontramos o alumínio, um metal branco-prateado. Trata-se do terceiro elemento químico mais encontrado no planeta, atrás apenas do oxigênio e do silício. É, portanto, o metal mais abundante na crosta terrestre. Mesmo assim, esse elemento foi descoberto apenas em 1827, já que não é encontrado naturalmente na sua forma metálica e o processo de obtenção do metal puro não foi trivial.
O nome “alumínio” veio do composto no qual foi encontrado pela primeira vez, o alume (sulfato duplo de potássio e alumínio), cuja fórmula é KAl(SO4)2. O alemão Georg Stahl, um brilhante teórico químico, foi provavelmente o primeiro a suspeitar que havia um elemento até então desconhecido no alume. Apenas um século depois esse palpite foi confirmado. Em 1827, o químico alemão Friedrich Wöhler (1800-1882), ao aquecer uma mistura de cloreto de alumínio com potássio metálico puro super-reativo, foi capaz de obter o alumínio puro, na forma de pó, que é fundido para se converter em sua forma mais familiar e brilhante. [1, 2]
Apesar de a descoberta ter sido um marco, a obtenção do alumínio puro a partir do processo desenvolvido por Wöhler era muito cara e inviável para produção comercial. [3] Com isso, esse metal de propriedades tão resplandecentes foi considerado, por algumas décadas, mais valioso que o ouro. Era comum, por exemplo, que talheres de alumínio fossem dados somente aos convidados mais importantes, enquanto aqueles considerados menos dignos utilizassem os de prata. Além disso, mulheres elegantes e ricas usavam joias feitas de alumínio. No entanto, apesar da já citada abundância, a disponibilidade ainda era escassa devido à dificuldade dos cientistas em encontrar um meio de extraí-lo do seu minério de origem. [4]
Muitos químicos se empenharam na busca por uma nova forma para obtenção do alumínio metálico até que, nos Estados Unidos, um estudante universitário chamado Charles Martin Hall (1863-1914), utilizando um equipamento caseiro na garagem de sua casa, passou uma corrente elétrica através de uma mistura fundida de criolita e óxido de alumínio (Al2O3) e... eureka! Nascia o Processo Hall para obtenção de alumínio puro, com a vantagem de ser muito mais barato que qualquer método proposto anteriormente, reduzindo o preço do metal em 20 vezes. [1]
Mas a história é um pouco mais complicada: na mesma época, Paul Héroult desenvolveu um processo semelhante na França e também foi bem-sucedido. Os registros mostram que Héroult apresentou sua patente em 23 de abril de 1886 na França e Hall em 22 de maio de 1886 nos Estados Unidos. Entretanto, tudo correu de forma amigável e, atualmente, conhecemos o processo como “Hall-Héroult” em homenagem a ambos. [4]
A principal fonte comercial de alumínio está nas grandes reservas de bauxita, que são encontradas em diversos países, sendo a China o maior produtor de alumínio metálico, seguida de Rússia, Canadá, Índia, Emirados Árabes, Austrália, Noruega e EUA. [5]
Considerando todas as possíveis aplicações, o alumínio é o segundo metal mais utilizado no mundo, ficando atrás apenas do ferro. É bastante versátil, dúctil e maleável, podendo ser puxado em fios finos ou martelado em finas folhas para variadas finalidades. Além disso, é um condutor de eletricidade com excelente custo-benefício (a prata e o cobre são melhores condutores, porém muito mais caros). O alumínio também está presente na indústria automobilística, nas mais diversas embalagens e equipamentos elétricos, além de materiais para construção civil, navios, pontes, aeronaves etc. O elemento possui ainda um grande diferencial em termos ambientais: quando fundido, pode ser reutilizado ou reciclado.
O alumínio é um dos poucos elementos abundantes na natureza que parecem não apresentar nenhuma função biológica significativa, mas é reconhecido como um potencial elemento neurotóxico, já que a exposição a altos teores causa prejuízos cerebrais ao longo da vida, como perda de concentração e déficits de memória de curto prazo. [6]
Embora a literatura científica sobre os efeitos adversos à saúde do alumínio seja extensa, os mecanismos moleculares exatos da toxicidade do alumínio ainda não são compreendidos. [7] Há pesquisas que associam o alumínio à doença de Alzheimer, mas ainda não existem evidências suficientes que confirmem essa hipótese. [6, 7, 8] Entre os possíveis efeitos prejudiciais do alumínio, podemos citar o estresse oxidativo, a inibição de várias enzimas (como a hexoquinase, a desidrogenase do glutamato etc.), a interferência no metabolismo celular e também a alteração da estrutura e da química de metabólitos e cofatores importantes. [8] Vale a pena enfatizar que pouco ou nada é conhecido sobre o comportamento do alumínio nessas vias bioquímicas. Portanto, mais pesquisas deverão ser feitas para elucidar possíveis impactos deste elemento no organismo humano.
*Docente do Curso de Química do Centro Universitário Unifieo.
Referências
[1] STRATHERN, Paul. O Sonho de Mendeleiev - A Verdadeira História da Química. 1. ed. Brasil: Zahar, 2002. 268 p.
[2] HOLMES, Harry N. Fifty Years of Industrial Aluminum. Science, v. 42, n. 3, p. 236-239, 1936.
[3] VENETSKI, S. 'Silver' from clay. Metallurgist. v. 13, n. 7, p. 451–453, 1969.
[4] GELLER, TOM. Aluminum: Common Metal, Uncommon Past. San Francisco, CA, 2007. Disponível em: https://www.sciencehistory.org/distillations/magazine/aluminum-common-metal-uncommon-past. Acesso em: 6 mar. 2019.
[5] KAY, Amanda. 8 Top Aluminum-producing Countries. Vancouver, 18 out. 2018. Disponível em: https://investingnews.com/daily/resource-investing/industrial-metals-investing/aluminum-investing/aluminum-producing-countries/. Acesso em: 20 mar. 2019.
[6] HUAT, Tee Jong et al. Metal Toxicity Links to Alzheimer’s Disease and Neuroinflammation. Journal of Molecular Biology, 2019. Disponível em: https://doi.org/10.1016/j.jmb.2019.01.018. Acesso em: 20 mar. 2019.
[7] MIU, AC; BENGA, O. Aluminum and Alzheimer‘s disease: a new look. J Alzheimers Dis. , v. 10, n. 2-3, p. 179-201, 2006.
[8] TORRE, Gabriele Dalla et al. The interaction of aluminum with catecholaminebased neurotransmitters: can the formation of these species be considered a potential risk factor for neurodegenerative diseases?. Dalton Transactions, 2019. Disponível em: DOI: 10.1039/c8dt04216k. Acesso em: 20 mar. 2019.